terça-feira, 17 de março de 2020

A caixinha das ideias e um lugar para o Sonho

Para lermos, pensarmos, agirmos e assim iniciar um novo caminho, com serenidade. 
Um artigo de opinião de Luísa Agante, professora de marketing na Faculdade de Economia do Porto e especialista em comportamento do consumidor infantil e juvenil.
Permita-se a si e aos seus filhos a sentir. Conversem sobre o que verdadeiramente estão a sentir. A sua ansiedade sobre estes temas é a expressão dos seus medos, é fruto de toda esta incerteza. Os seus filhos também têm muitos medos. Não os vão deixar de ter só com vídeos educativos sobre o vírus. Não os vão deixar de ter se continuarem a ver os pais ansiosos, preocupados apenas com o rendimento escolar, no meio de um caos que ninguém sabe para onde vai ou quando vai terminar. Por isso converse com eles sobre o que verdadeiramente estão a sentir. Quais as suas maiores preocupações? Na verdade, podem estar relacionadas com os estudos ou com a vida longe dos amigos amigos e namorados. Neste momento estão confinados a um espaço que é casa e escola ao mesmo tempo. Sem possibilidade de espairecer. Numa casa cheia, o único momento que eles têm para espairecer é muitas vezes a ida à casa de banho. Até ouvir uma voz lá fora a questionar “Demoras muito?”.
Aproveite para conversar com eles sobre os seus sonhos e como tudo isto afeta ou não os seus sonhos. Por exemplo, muitos pais e professores incentivam os bons alunos a ir para Medicina e os jovens quase que se sentem mal se escolherem outros cursos que não sejam os das médias altas e muito concorridos. Alguns desses jovens, que estão agora a exercer Medicina, de certeza que não equacionaram um cenário como o que vivemos hoje, de “requisição civil”, de irem para a “frente de batalha”, correr riscos, sem o material adequado, com espírito de missão. Seria isto que os pais deles tinham em mente quando os forçavam a estudar para os exames nacionais? Ou era algo mais glamoroso?
USAMOS CRITÉRIOS NA ESCOLHA DO FUTURO DOS NOSSOS JOVENS QUE NADA TÊM A VER COM OS SEUS SONHOS, COM A SUA VOCAÇÃO. SERÁ QUE ESTAMOS CERTOS? NÃO TENHO UMA RESPOSTA, MAS SINTO QUE ESTE CENÁRIO EM QUE VIVEMOS NOS VAI FAZER REPENSAR MUITAS DAS NOSSAS ESCOLHAS
Será que, quando fazemos recomendações aos nossos filhos, sabemos sempre tudo? Ou estamos apenas a agir com base nos nossos medos e pressupostos? Ouvi uma vez uma mãe comentar que o seu filho lhe tinha dito que queria ir estudar Música. E a mãe estava em pânico. Dizia que tudo faria para o dissuadir, para que ele não passasse uma vida de penúria. Iria fazer uma universidade júnior em engenharia para ver se mudava de ideias... Penso que estão a ver onde quero chegar.
Usamos critérios na escolha do futuro dos nossos jovens que nada têm a ver com os seus sonhos, com a sua vocação. Será que estamos certos? Não tenho uma resposta, mas sinto que este cenário em que vivemos nos vai fazer repensar muitas das nossas escolhas e muitas das opções de vida que fazíamos no passado. Haverá um antes e depois do coronavírus. De repente agora já não interessa a aula de ballet, o treino de futebol, a roupa que levo para o trabalho (caso esteja a trabalhar em casa), o restaurante onde vou jantar no sábado, a festa de aniversário do fim-de-semana ou o que vou comprar no dia do pai ou da mãe...
Por isso aproveite esta oportunidade e assuma o seu papel de pai/mãe, que é o de deixar a sua criança/jovem desenvolver o seu maior potencial. Não está ninguém a ver o que faz (a não ser que partilhe nas redes sociais o seu dia a dia como algumas pessoas começam a fazer). Assuma as rédeas da educação dos seus filhos. Veja aquilo que é exigido pela escola e corresponda, mas perceba o que faz sentido no seu caso. Distinga o essencial do acessório. Ajude também os professores e dê feedback sobre o que está a correr bem para que eles saibam que tipo de atividades são melhor recebidas, e oportunidades de melhoria, mas deixe os professores respirarem (estão a receber inputs de vários alunos, todos diferentes).
Use o tempo extra que ganhou e introduza novos ensinamentos. Divida as tarefas domésticas, ensine os seus filhos a cozinhar, a arrumar e a limpar a casa. Controle as horas de televisão, computador e telemóvel. Não terá tão cedo uma oportunidade como esta para ter os seus filhos tanto tempo consigo.
Em suma, deve-se organizar o estudo das crianças em casa olhando em primeiro lugar para a criança. Ouça o que ela precisa, atenda ao que é solicitado pela escola, sabendo que as necessidades da criança não estão só relacionadas com a escola, e que por isso o importante é que ultrapasse este período com serenidade, conhecendo-se melhor a si própria, sabendo que os seus pais estão ali para lhe permitir concretizar os seus sonhos, e que estamos todos interligados. A vida é perfeita e o universo tem os seus métodos, por vezes um pouco duros e estranhos, de nos fazer ver as coisas tal como elas são.


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